segunda-feira, 21 de maio de 2007

Agra, Agrela, Agrinha, Agro, Agrelo, Agrinho. Do latim hispânico à toponímia.

“Agra” provém de “agro” e este do étimo latino agru- (acusativo do substantivo masculino ager, agri), que designava o “campo” ou a “terra cultivada”, mas também “o campo em oposição à cidade”. A voz destes topónimos, na forma simples ─ “agra” e/ou “agro” ─, continua viva em português e galego.
Em português, o substantivo “agro” é apelativo para “terreno cultivado ou potencialmente cultivável, campo”, o mesmo se podendo dizer de “agra”, que já aparece no
Nobiliário do conde D. Pedro como sinónimo da forma masculina, a designar uma “terra lavradia”.
No galego temos igualmente o substantivo masculino “agro”, designando uma “
extensión de terreo cultivable, pequeno e da propiedade dunha soa persoa”, enquanto o feminino “agra” é apelativo para “conxunto de parcelas de labradío pertencentes a varios propietarios e pechadas por un valado común
A marca do feminino dever-se-á, porventura, à atracção de “terra”, de que temos um registo no microtopónimo “Terras das Agras”, na freguesia de Nariz, concelho de Aveiro. Um comentário de Orlando Ribeiro, inserido numa caracterização da economia antiga do Noroeste hispânico, e referido a este apelativo, parece dar razão a esta hipótese:
Os cereais eram todos de sequeiro e exigiam terras enxutas (agras), onde se cultivavam alternadamente espécies de Inverno ─ trigo, centeio, cevada ─ e de Verão ─ milho alvo e painço (Ribeiro, 1986: 111-112).
Na Galiza as "agras" constituíram uma forma de organização agrária, havendo pelo menos duas em cada aldeia, uma para cada folha de cultivo. Eram amplos terrenos de cultivo, principalmente de cereais, que, embora delimitados no seu conjunto, estavam divididos em parcelas abertas. Estes campos galegos tinham, nalguns casos, outras denominações, como veiga, vilar ou estivo (Villares, 1991: 27), e eram os usos colectivos que regiam o ritmo dos respectivos trabalhos, e determinavam o tipo e a alternância de cultivos (EGU, vol. 1, p. 217).
No Norte de África encontramos a voz berbere
aghrum, com o significado de “pão”, coincidente com a forma latina, mas por certo um empréstimo desta língua, considerando o largo período de presença romana em toda esta zona.
Para Joseph Piel (1989: 56), arcaísmos e galego-minhotismos como
agro, agra, agrela, conservados na toponímia, identificam-se com o latim-hispânico falado na Galécia, ainda durante a época romana, província que já então ganhara foros de especificidade, face à latinidade de outras regiões da península.

Portugal, concelho de Aveiro (são quase todos microtopónimos; entre parênteses a respectiva freguesia): Agra (Aradas; Cacia; Esgueira, Glória), Agra dos Andoeiros (Esgueira), Agra de Aradas (Aradas), Agra de Baixo (Aradas), Agra de Cacia (Cacia), Agra de Cima (Cacia; Esgueira), Agra do Couto (Glória), Agra do Crasto (Aradas), Agra de Dentro (Cacia), Agra de Esgueira (Esgueira), Agra do Facho (Esgueira), Agra de Fora (Esgueira), Agra dos Frades (Glória), Agra Grande (Esgueira), Agra Grande das Ribas (Esgueira), Agra dos Judeus (Glória), Agra de Mariola (Esgueira), Agra do Meio (Cacia), Agra Moreira (Esgueira), Agra do Norte (Cacia), Agra Nova (Cacia), Agra do Paço (Esgueira), Agra da Pedra de Moura (Aradas), Agra Pequena (Esgueira), Agra das Ribas (Esgueira), Agra das Roçadas (Esgueira), Agra de Sá (Vera Cruz), Agra de São Tomás (Glória), Agra dos Selões (Cacia), Agra de Verdemilho (Aradas), Agra de Vilarinho (Cacia), Agras (Taboeira, freguesia de Esgueira), Agrinha(s) (Glória), Agro (Eixo; Esgueira; Requeixo), Chão da Agra (Cacia), Portal da Agra (Esgueira), Rua da Agra (Cacia), Terras das Agras (Nariz), Viela da Agra (Aradas; Esgueira), Vinha da Agra (Cacia).

Portugal (ocorrências registadas na Carta Militar 1:25.000):
Agra (47), Agra Boa, Agra da Apúlia, Agra da Pedra, Agra de Além, Agra de Alvar, Agra de Baixo, Agra de Bouças, Agra de Cima (2), Agra de Friope, Agra de Ordins, Agra de Sol, Agra do Barreiro, Agra do Crasto, Agra do Matinho, Agra Maior (2), Agra do Monte, Agra Nova (2), Agras (30), Agras de Cidai, Agras de Oliveira, Agras do Rio, Agrelas (35), Agrelo (21), Agrelo de Baixo, Agrelo de Cima, Agrelos (17), Agres (4), Agria (2), Agriboa, Agricha, Agrichouso, Agriela, Agrinha (4), Agro (13), Agro de Baixo, Agro do Monte, Agro Velho (3), Agroal (2), Agrobom, Agrochão (4), Agrochão de Além, Agrochão de Cima, Agrolongo, Agropilheiras, Agros (5), Agrosso, Agrovelho, Agruela, Carreira de Agra, Casa das Agras, Casa de Agra, Casa do Agro, Casal da Agreireira, Casal do Agrão, Chão de Agrela, Chão de Agro, Costa da Agrela, Costa do Agrancho, Couto do Agro, Cruz de Agra, Fraga de Agrelos, Lomba dos Agros, Pedra do Agro, Poço do Agro, Ponte de Agrela, Portela do Agro, Porto de Agra, Porto de Agre, Quinta da Agra, Quinta do Agrinho, Regato de Agras, Ribeira de Agrebom, Ribeira dos Agros, Ribeiro da Agrela, Ribeiro de Agrebom (2), Rio Agro (2), Rio de Agrela, Serra da Agrela, Tapada dos Agrões, Vale Agreiro, Vale da Agrela, Vale de Agrelo, Vale de Agrozelo.

Galiza (ocorrências registadas no Nomenclátor de Galicia):
A Agra (11), A Agra Boa, A Agra da Pedra, A Agra das Arcas, A Agra das Breas, A Agra de Abaixo, A Agra de Pares, A Agra de Samosteiro, A Agra de Vales, A Agra do Fondo, A Agra do Mero, A Agramuíña, A Agraxoiba, A Agrela (13), A Agrela de San Vicente, A Agriña (2), A Cruz de Agrelo, A Fonte da Agra, As Agras (2), Agra (7), Agra de Abaixo, Agra de Arriba, Agra do Regueiro, Agra Pequena, Agrafoxo, Agramaior, Agramar, Agramonte (2), Agranzón, Agravil, Agrazán, Agreimonde, Agrela, Agrelo (6), Agrelos (2), Agrexán, Agris (3), Agro da Cuña, Agro do Chao, Agro do Monte, Agrochail, Agrochao (2), Agrochouso, Agrocovo, Agrodosío, Agroi, Agrolento, Agrolongo (2), Agromaior (4), Agrón, Agronovo, Agros Chaos, Agrosagro, Agrosantiño, Agrovello (2), Agroxoi, Agruchave, Agrufeixe, Agruñá, Anllóns de Tras dos Agros, Arriba do Agro, As Agrolazas, Casal de Agra, Campo da Agra, Montaña de Agra, O Agrande, O Agrelo (2), O Agriño (8), O Agro (7), O Agro da Area, O Agro da Moa, O Agro de Quinta, O Agro do Mestre, O Agro do Pobre, O Agro do Santo, O Chan da Agra, O Cimo da Agra, Os Agriños, Os Agros (3), Os Agros da Vila, Penadagra, Santalla de Agrón, Tras da Agra (2), Tras do Agro.

Bibliografia:
EGU – Enciclopédia Galega Universal. Vigo: Ir Indo, 1999-2006. 16 vol.
PIEL, Joseph-Maria (1989) – Estudos de linguística histórica galego-portuguesa. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1989. 282 p. (Estudos Gerais/Série Universitária).
RIBEIRO, Orlando (1986) – Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico: esboço de relações geográficas. 4ª ed. rev. e ampl. Lisboa: Livraria Sá da Costa. 189 p. (Nova Universidade; nº 13)
VILLARES, Ramón (1991) – História da Galiza. Lisboa: Livros Horizonte. 181 p. (Horizonte Histórico; nº 38). Tradução de “Historia de Galicia”, Madrid, Alianza Editorial. ISBN 972-24-0812-7.

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